Além de atuar para aumentar a força de trabalho no setor de TI, o presidente do Sindinfor, Fábio Veras, diz que a grande virada desse segmento está nas cidades com espaços abertos à inovação incentivando comunidades mais criativas, mais ousadas e com mais criação de valor. A seguir, a entrevista de Fábio Veras dada à coluna Minas S/A:

Quantas empresas o sindicato representa e qual é a geração de negócios em Minas e empregos neste setor?

São 45.410 trabalhadores em TI em Minas Gerais (dados de 2020) numa base de 4.800 empresas, desde grande, médias e pequenas. No Brasil, são 506.744 empregos gerados no setor de TI. Hoje, o setor de TIC (hardware, software, serviço, nuvem, estatais BPO e exportações) chega a representar 6,8% do PIB.

Em relação à preparação dessas empresas, qual é o protagonismo que elas precisam tomar para os próximos anos?

São basicamente dois perfis de empresas no segmento de TI: aquela casa de software tradicional com capacidade de desenvolvimento de soluções customizadas incríveis e as empresas de tecnologia de produtos. A grande mudança é que essas empresas estão percebendo que podem diversificar o nicho não só de seus produtos como de novos negócios e novas empresas a partir da base de desenvolvimento tecnológico que é o ativo mais escasso e mais valioso hoje. Mesmo grandes empresas têm um contingente de desenvolvedores ou programadores intenso em número de funcionários e que de alguma maneira competem na disputa desse profissional com o mercado de TI. O setor de TI está pronto para crescer intensamente e a gente vive esse apagão da mão de obra. Não se formam desenvolvedores e programadores na mesma proporção que o setor demanda. Hoje, um programador sênior pode custar até R$ 20 mil para uma empresa. O Sindinfor tem trabalhado intensamente em parceria com a Fiemg e o Senai e outros players para aumentar a força de trabalho.

Como fazer a fusão, se é possível, de empresas tradicionais para aproximar cada vez mais setores tradicionais da economia com o setor de tecnologia?

Alguém disse um ditado que “a palavra impulsiona, mas o exemplo arrasta”. Então, temos promovido encontros entre os segmentos tradicionais e os de tecnologia. Toda empresa, num futuro próximo, terá que ser uma empresa de tecnologia.

Por quê?

O funil de vendas, por exemplo, se você pensar a área comercial, quem não tem o funil digital por meio das redes sociais e de estratégia de escala de alcance de mercado, vai ficar para trás em relação a quem tem. Então, mesmo a menor lanchonete, a menor confecção tem que ter sua loja virtual.

Em Minas qual é o tipo de negócio na tecnologia que tem conseguido mais mercado e mais escala?

Existem segmentos que tem crescido mais e se transformado mais rapidamente. A saúde representa um potencial gigantesco porque ainda é um modelo extremamente conservador e com steakholders que não compreenderam a gravidade da mudança. O varejo, a gente acredita que vai passar por muitas mudanças, a educação vai trazer muitas oportunidades porque ficou provado que esse modelo é insuficiente para atender a chamada geração Z.

Minas continua com o protagonismo de gerar força de trabalho no setor de tecnologia, centro de inovação, ou perdeu espaço para outros Estados?

Estamos bem posicionados. Talvez, a grande diferença, é que Estados como Santa Catarina e São Paulo, tenham uma irrigação de investimento em novos negócios por uma cultura de correr risco por parte de quem tem o capital maior do que o empresariado mineiro. Essa cultura de investimento em negócio de maior risco e portanto de maior retorno é algo que a gente tem que melhorar e o Sindinfor está trabalhando. Mas sob o ponto de vista do protagonismo tecnológico e da inteligência e da força empresarial, a gente não deve a ninguém do Brasil.

Qual seria o conselho para o governo criar um ambiente ainda mais favorável para as empresas?

São políticas federais de desoneração máxima do investimento. Precisamos de uma estratégia nacional de formação tecnológica é algo que demanda um projeto de lei (estamos conversando isso com os presidente do Senado, Rodrigo Pacheco; e da Câmara, Artur Lira). No plano estadual tivemos evolução com a Lei Estadual das Startups sendo o deputado Antônio Carlos Arantes, vice-presidete da ALMG, o líder desse projeto de lei e que permite ao Estado fazer contratações e soluções tecnológicas para empresas com até 10 anos e isso vai nos dar um potencial muito interessante. Mas a grande virada está nas cidades porque na medida em que tem espaços cosmopolitas contemporâneos, e que sejam abertos a inovação, a gente cria comunidades mais criativas, mais ousadas e com mais criação de valor. O que é o Vale do Silício na Califórnia (EUA)? No século XIX havia uma imigração brutal de orientais para a construção de ferrovias porque era uma mão de obra barata que corria mais risco. E o caminho de entrada delas foi pela Califórnia. Quando uma população recebe um povo de olho puxado, de cultura, de língua e de gastronomia diferentes, começa a se adaptar ao novo e transformá-la ao novo normal. O urbanista Richard Florida escreveu o livro Who is Your City (quem é a sua cidade) e ele cita três características fundamentais para uma cidade ser inovadora que são os 3 ts (tecnologia, talento e tolerância). Não por acaso, foi na Califórnia, na década de 60, que o Movimento de Defesa dos Homossexuais, os movimentos civis por tolerância aconteceram porque é uma cidade que é acostumada à diferença. O que isso tem a ver com inovação e tecnologia? Se você olhasse o primeiro protótipo da câmera digital, que hoje está embutida em nosso celular, era uma caixa de 20 quilos. E nenhum de nós diria que aquilo iria revolucionar o mercado de tecnologia incorporando através do uso do celular o smartphone muito mais que um aparelho de telefone. Quando você tem um olhar aberto ao novo, quando você se despe do preconceito e da rigidez, você se abre a nova descoberta e portanto a novos negócios, a novas oportunidades. Foi isso que aconteceu no Vale do Silício, esse olhar transcendente, esse olhar aberto, esse olhar puro que respeita a diferença, que respeita aquilo que é diferente do que você pensa, do que você acredita. Esse tipo de ambiente faz cidades mais criativas, mais inteligentes e que recebe empreendedores mais ousados e tecnológicos. Toda cidade que criar um ambiente para isso irá atrair mais pessoas interessadas em qualidade de vida e propósito. Eu acredito isso faze diferença para um ambiente de diversificação econômica que Minas Gerias tanto precisa.

Fonte: Jornal O Tempo